Fita preta em sinal de luto em
táxi de Santa Maria
Taxistas e coveiros buscam ajuda psicológica em Santa Maria
Desde as primeiras horas após o incêndio que matou 235 pessoas em uma boate de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, psicólogos vêm fazendo um trabalho de acompanhamento das famílias e amigos das vítimas.
Mas não são apenas aqueles diretamente atingidos
pelo desastre que necessitam de assistência. Nos últimos dias, pessoas que de
alguma forma tiveram contato com a tragédia na cidade, como taxistas e
coveiros, também procuraram o serviço de auxílio do núcleo psicológico de
emergência criado após o incidente.
Com uma equipe de 130 pessoas, o serviço
vem funcionando 24 horas por dia para atender à demanda de pacientes. Além
disso, os especialistas têm visitado casas de familiares, hospitais e
acompanhado os enterros e velórios dos mortos no incêndio da boate Kiss.
"Nem todas as pessoas precisam de
atendimento de saúde mental. Algumas têm suas redes sociais, suas redes
psíquicas, redes religiosas que resolvem. Quase 70% das pessoas poderão
resolver isso em suas redes afetivas", afirmou Maria de Fátima Fischer,
psicóloga e representante do Estado do Rio Grande do Sul no núcleo, à BBC Brasil.
"Agora, pouco mais de 20% das
pessoas envolvidas diretamente, indiretamente ou mesmo que não tiveram relação
com o evento, precisarão de algum cuidado. Já entre 1% e 3% das pessoas podem
desenvolver casos graves de saúde mental", acrescentou a psicóloga.
Ela conta que, além de atender aos
parentes e amigos das vítimas, o programa vem auxiliando bombeiros e policiais
que atuaram no resgate, médicos, coveiros responsáveis pelos enterros e até
taxistas.
"Eles estão fazendo o trabalho
deles e têm que aguentar essa barra. Eles têm que ouvir muitas coisas, alguns
perderam parentes", disse Maria de Fátima, que afirmou que o grupo está em
contato com associações de taxistas para oferecer auxílio. Professores universitários
que perderam seus alunos também serão orientados pelo programa.
Luto
A equipe de atendimento vai funcionar 24
horas por dia durante todo o primeiro mês após o desastre, mas os trabalhos
devem continuar por pelo menos seis meses. Segundo a psicóloga, há várias
formas de luto após uma tragédia como a do último domingo.
"É esperado que as pessoas gritem,
briguem, enlouqueçam nessa hora. As pessoas têm que não dormir ou não comer por
um tempo até que a coisa possa ser melhor resolvida", diz.
Segundo ela, no entanto, outras pessoas
atingidas podem desenvolver estados de luto que podem durar anos e que envolvem
também uma depressão física, com distúrbios alimentares e de sono.
"Um mecanismo importante para
outras é negar a morte, mas isso fica represado e vai aparecer em algum
momento."
Para lidar com estas situações, as
equipes desenvolveram estratégias para auxiliar familiares e amigos durante os
enterros e velórios.
"É importante para a maioria das
pessoas que elas vejam o corpo para que possam concretizar que aquilo
aconteceu. Então, houve famílias que chegaram quando os caixões já estavam
fechados, e nós abrimos. Algumas pessoas precisam viver isso, se não parece que
aquilo não aconteceu."
A psicóloga afirma ainda que é
necessário criar eventos na cidade que, de alguma forma, se coloquem
"contrários" à tragédia. Ela cita como exemplo a marcha organizada na
última segunda-feira em que milhares de pessoas vestidas de branco carregaram
flores e cartazes com fotos das vítimas do incêndio.
"É uma resposta de solidariedade
contra a solidão, as pessoas começam a sentir que a dor é compartilhada. Os
símbolos de luto nas lojas e casas também ajudam neste sentido."
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